Há algum tempo atrás escrevi sobre direitos que queria de volta. Dentre eles, figurava o direito à infelicidade!
Por Eliana Rezende, do
GGN
Talvez
questionável por alguns, estranho para outros. Para mim, uma
observadora contumaz da sociedade uma necessidade fundamental.
É
interessante como essa sociedade que nos impõe tantas obrigações como
levantar, trabalhar, escovar os dentes, fazer atividades físicas, nos
relacionar…também queira que tudo ocorra sem falhas, titubeios e, em
muitos casos fracassos. Mas será mesmo possível?
Ainda outro dia
lia sobre se preferiria viver ou ser feliz. E me lembro de ter dito que
preferia a vida: o que significa dizer que há ondas com momentos que vem
e que vão de felicidade alternadas com tristezas…nem sempre tudo corre
bem. A felicidade linear e constante é utopia e absurda se colocada no
plano do real.
A felicidade como obrigação é em nossa sociedade igual a se obter sucesso profissional ou pessoal.
O
sujeito precisa todo o tempo estar feliz, saltitante e em constante
alegria para não ser questionado. E é de tal forma exigido que num
comprimento cotidiano quando nos perguntam “tudo bem?” ninguém espera
ouvir algo diferente de um sim!
Será mesmo possível tal situação? Será mesmo possível tudo sempre correr bem e certo todo o tempo?
Impossível
não lembrar nesse ponto do grande poeta Fernando Pessoa pelas linhas de
seu heterônimo Álvaro de Campos no “Poema em Linha Reta”. Lembram-se?
Transcrevo-o:
“Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.
Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe – todos eles príncipes – na vida…
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,
Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos – mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.”
Esse é o sentido da poesia e dos poetas: parecer sempre ter as palavras que precisamos para nominar e interpretar o mundo…
Sempre encontramos um que nos represente e achei que Pessoa casava como luva para este tema.
Não
vejo a felicidade como obrigação e considero que vez por outra a
sensação de infelicidade pode dar-nos o sentido de realidade que em
algumas circunstâncias perdemos. Faz-nos ver que a vida possui ciclos e
que nem tudo em todo o tempo pode ser 100% como desejamos.
Em
verdade, a felicidade é muito mais um conta-gotas. E saber
experimentá-la nas doses adequadas nos fará sem dúvida maiores
apreciadores destes breves momentos.
Entenderemos a vida e a felicidade
decorrente e possível como uma conquista diária e não como um dado
obtido por sermos o que somos. Assim, fica no rol dos cultivos.
Tão essenciais para nos dar o sentido de humanos que somos.
Por Gabriela Gasparin
Você
já parou para pensar sobre qual é o sentido da vida? Eu já, e muito. Eu
não lembro exatamente quando foi que comecei a questionar a nossa
existência aqui na Terra, mas foi aos 27 anos que resolvi colocar para
fora minha inquietação.
A solução que encontrei foi sair por aí
perguntando a desconhecidos a resposta e compartilhar os depoimentos em
um blog, o Vidaria (
www.vidaria.com.br). Batizei o projeto de “Vidaria” em alusão a uma livraria, como se fosse uma “coletânea de sentidos da vida”.
Eu
me formei em jornalismo em 2007. Quando comecei o blog, em 2013, eu já
tinha bastante experiência em redações e em entrevistar pessoas. Mesmo
assim, confesso que fiquei um pouco insegura ao fazer tão profunda
indagação a desconhecidos. Não dá para abordar alguém na rua, de
repente, com um: “oi, tudo bem, você sabe qual é o sentido da vida?”
Percebi
a necessidade de criar intimidade com os entrevistados e conhecer suas
histórias antes de fazer o filosófico questionamento. Com isso, tive
contato com “vidas” que jamais conheceria se não fosse o projeto. Eu fui
à prisão falar com detentas. Falei com moradores de rua. Conversei com
milionários. Entrevistei artistas, empresários, pessoas que adquiriram
doenças graves, como um câncer ou o vírus do HIV.
Indaguei idosos e
crianças. Falei com os turistas que vieram pro Brasil na Copa. Conversei
com quem perdeu os pais ou um filho único. Com travestis, homossexuais,
líderes religiosos. Questionei qual é sentido da vida aos meus próprios
pais e familiares.
Há pessoas
humildes que enxergam na vida uma forma de evolução. Outras que entregam
a existência a Deus. Pessoas que citam fazer o bem, ser honesto, amar
os demais, cuidar de familiares como o propósito da vida.
Quem perdeu os
pais ou um filho conta como encontrou motivo para superar a perda e
seguir em frente. Ex-criminosas que se arrependeram de crimes e afirmam
que querem melhorar. Há também quem não vê mais sentido na vida e apenas
espera a morte. Quem se arrependeu de não ter vivido mais intensamente.
Com
o passar do tempo, após ouvir tantas respostas, eu comecei a
questionar: afinal de contas, qual é o sentido da minha própria vida?
Confesso
que mergulhar no tema tem causado uma reviravolta em minha própria
vida. Afinal de contas, quando paramos para pensar verdadeiramente “qual
é o sentido da nossa vida”, a probabilidade de não encontrarmos uma
resposta clara de imediato é muito grande. Também podemos perceber que a
vida que levamos não é bem aquela que gostaríamos.
Longe
de mim querer dar qualquer resposta. O meu intuito é apenas provocar a
reflexar e mostrar respostas para nos inspirar e nos fazer refletir
sobre a vida. Quem sabe assim não podemos dar um ponto inicial para
direcionarmos nossas trajetórias para onde sinceramente queremos ir?
Para
quem quiser acompanhar, vou compartilhar alguns dos mais de 100
depoimentos que já colhi aqui no Conti Outra. É claro que eles também
estão no meu blog, o
www.vidaria.com.br. E deixo aqui a reflexão: qual é o sentido da vida para você?

Gabriela Gasparin
Jornalista, blogueira e escritora.
Em 2013 criou o blog
www.vidaria.com.br,
onde publica depoimentos sobre o sentido da vida. O trabalho resultou
no livro “Vidaria, uma coletânea de sentidos da vid